Uma solução para o desemprego
Entretanto – “visão das direitas” - afirma-se que os subsídios de desemprego e o rendimento mínimo mais não fazem que incentivar a preguiça e carregar quem trabalha com impostos; enquanto na “visão das esquerdas” o desemprego é uma chaga social que acarreta miséria, e importa combater dificultando os despedimentos.
Parece então que afinal o desemprego não é assim tão bom.
Mas o desemprego tem ainda outra faceta, muito pouco referida, mas não menos nociva que as anteriores: a de deprimir, transmitir uma sensação de inutilidade, a quem por ele é afetado. Depois de um jovem ter estudado durante 15 anos ou mais, em que os pais e professores o incentivaram (quando não obrigaram) a esforçar-se, e ele próprio teve muitas vezes de vencer o cansaço e o desânimo – depara-se agora com a inutilidade do seu estudo. E se o desemprego bater à porta de alguém com cinco décadas de vida esse alguém (homem ou a mulher) pode facilmente pensar que está “acabado”, que a sua vida terminou.
Ora não se pode viver sem esperança.
Não falando que a falta de empregos provoca uma competição exagerada, que começa por vezes desde os bancos da escola - os colegas deixam de ser “colegas” para passarem a ser “concorrentes” ou mesmo “ameaças”; e na desatualização e perda de competências que a inatividade acarreta.
Mas agora – perguntemos: e porquê tais níveis de desemprego?
A resposta é fácil – porque hoje cada homem dispõe, hoje em dia e em média, do equivalente a 100 escravos – sob a forma de máquinas que lhe aquecem a água do banho, acendem o fogo, o transportam, lavram e colhem, fabricam os mais variados objetos, copiam livros, ensinam, trocam dinheiro...
É por isso, para “dar que fazer” a tanto “escravo”, que uma boa parte da população vive afogada em objetos – pares de sapatos, livros, roupas, maquinaria vária, brinquedos... E como ainda assim ficaria muita gente desempregada há que mascarar o desemprego: e para tal, nos países ricos, multiplica-se o número de pessoas que trabalham em atividades culturais, desportivas, que estudam ou fazem estágios, etc.; enquanto nos países pobres se recorre sobretudo ao aumento do exército e da função pública.
Creio ser tempo de encarar o assunto de frente. Se há tanta gente desempregada e outros tantos em empregos de interesse pelo menos duvidoso é porque não é preciso trabalhar tanto. E para que todos trabalhassem (haverá sempre 1 ou 2 % residuais que por desadaptação não conseguem emprego) o trabalho existente seria dividido por todos, tendo assim cada trabalhador de trabalhar menos horas. De facto esta é a tendência histórica – no início da Revolução Industrial os operários chegavam a trabalhar 16 horas por dia. Em França as 12 horas de trabalho foram conseguidas após a revolução de 1848, as 8 horas vieram em 1936. Em Portugal as 8 horas de trabalho datam da 1ª República.
Entretanto estas reduções, embora tornadas possíveis pela crescente mecanização, foram resultado de movimentações sindicais; já a redução das horas de trabalho para criar mais emprego é um movimento recente. Esta solução iniciou-se no ano de 2000 em França (35 horas de trabalho e 5 semanas de férias), e está em expansão atualmente na Suécia (6 horas de trabalho por dia, sem implicar redução de salários); mas não foi favoravelmente recebida pela generalidade do patronato e capital internacional, que via diminuídos os seus lucros (embora na Suécia as 6 horas de trabalho já sejam praticadas pela Toyota desde há 13 anos; e o famoso Henry Ford praticasse, nas suas fábricas, horários de 8 horas, o que para a época era um horário reduzido). Em Portugal, recentemente, optou-se pela oposta, aumentando o número de horas de trabalho na esperança de assim tornar os investimentos mais rentáveis e aumentar o seu número; mas a nível global este tipo de soluções terá pouco efeito, dado apenas deslocar o desemprego de uns países para outros.
Desta forma, e para que não se invocasse que a redução de horas de trabalho iria pôr as empresas em situação difícil, esta redução de horas seria acompanhada por uma redução de ordenados - embora numa proporção ligeiramente menor que a redução de horas de trabalho, pois trabalhando menos horas o trabalhador ficará menos cansado e terá maior rendimento horário (sem contar que a redução não poderia passar certos limites pois atualmente em Portugal muitos ordenados estão quase ao nível da sobrevivência). Essa redução de ordenados só aparentemente se traduziria num “castigo” para o trabalhador, ou mesmo para o capital: para o trabalhador pois o atual desempregado está a ser sustentado – seja pelo Estado, pelos pais, pela mulher, ou, inclusive, por atividades ilícitas – e diminuindo os desempregados famílias e Estado ficariam mais aliviados. Numa família em que, p. ex., apenas a mulher estivesse a trabalhar ganhando 800 euros, e o marido desempregado, baixando o salário da mulher para 700 euros, mas passando o marido a estar empregado o rendimento do casal passaria para 1400 euros; e pagariam menos impostos pois as verbas para o desemprego baixariam. Para o capital também traria benefícios, pois os impostos diminuiriam (dada a diminuição dos gastos em subsídios de desemprego; e a . previsível diminuição de baixas por doença, pois o stress diminuiria). Mais: arriscamo-nos a prever que o número de crianças aumentaria, pois a atual instabilidade a nível de empregos (sobretudo para os jovens) é uma das causas que leva a adiar a maternidade/paternidade (ainda que continuasse a instabilidade os períodos sem emprego seriam muito mais reduzidos).
E – last but not least – os pais teriam mais tempo para brincar e acompanhar os filhos.
E então – poderá perguntar o leitor - como é que se levavam as firmas a tal solução? E não haveria empresas em que os empregados trabalhariam legalmente seis horas mas na prática oito ou dez? E...
Como em tudo os problemas (supostos ou reais) seriam muitos. Mas não se pode prever como iremos educar os filhos antes destes nascerem. Para nos orientarmos na vida há no entanto que saber para onde queremos ir.
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ROQUE LANE